Combo - Teologia Bíblica
Filemom não é uma carta, é um bilhete. Um capítulo, meia página. Ao longo de anos tenho lido e relido essa epístola. E, assim, a amado ainda mais. Todos os comentários bíblicos que consultei a consideram um bilhete pessoal, desimportante, com assuntos particulares que envolviam apenas o autor e o destinatário. Mas, a carta a Filemom, para mim, tem três implicações seríssimas: alterações nas relações de poder, alterações das relações sociais e alterações nas relações comerciais. É pouco? É desimportante? Se essas alterações, ou se essas fulcrais subversões do Evangelho são questões triviais, então, o Evangelho compulsoriamente é também inútil e trivial?
Espero que, como aconteceu comigo, os leitores se identifiquem momentaneamente com cada personagem. A intenção é nos ajudar a entender porque ao longo dos séculos, e, talvez ainda mais no presente, a carta a Filemom foi esquecida. Propositalmente?
Os estudos bíblicos no Brasil e na América Latina contam hoje com muitos especialistas antenados com as vanguardas da pesquisa internacional. Neste volume nos encontramos com autoras e autores de uma geração de exegetas formados e atuantes no Brasil, docentes, a maioria, de teologia e ciências da religião. Quanta diferença de três décadas atrás, quando ainda se faziam necessários professores missionários estrangeiros para cobrir uma enorme lacuna de quadros. Mas não se trata apenas de quadros para formação. A exegese bíblica brasileira conta com abordagens que dialogam com seu contexto cultural, com sua sociedade e sua religiosidade. Trata-se de uma interpretação bíblica forjada na relação com nossa realidade. Arrojo técnico e acadêmico se alia a uma sensibilidade para com o complexo contexto religioso brasileiro.
Paulo Nogueira
Esta obra é uma leitura a partir da América Latina que explora o testemunho bíblico do "Deus que está", o Deus que acompanha e nunca abandona. É uma leitura do Antigo Testamento em que se testemunha a fome e se deseja revelar a direção de onde está o pão. Não satisfaz, mas anuncia o tempo em que a dor será curada, o espaço final em que toda mancha, por mais escura que seja, será purificada. Um Deus que, mesmo nas piores circunstâncias está com seu povo e o desafia a construir um mundo com justiça e equidade. Estas páginas nos ajudarão a submergirmos no mundo do Antigo Testamento e descobrir um espaço fascinante, cheio de perguntas e desafios, de palavras antigas que ressoam como novas, e onde arde uma chama que as muitas águas não podem apagar.
Paulo. Este nome tem sido pronunciado cotidianamente ao redor do mundo. Direta ou indiretamente, por religiosos ou não-religiosos, lá está, na teologia, na literatura ou na política, o fantasma do apóstolo. Talvez, na boca daqueles que falam Jesus, haja mais Paulo do que Jesus. Isto porque, claro, grande parte dos projetos teológico-políticos que repercutiram as tradições antigas do cristianismo são paulo-cêntricos para prosseguirem falo-cêntricos. Saulo, Paulo, Falo - uma genealogia estratégica. A única possível? Não. Mas, certamente, a vencedora. Nasce uma crença hegemônica, resultante da inseminação miraculosa das vontades de um "Autor Divinamente Inspirado". Aí está o núcleo do problema-Paulo, que tem sido tomado como um. Um sujeito, um autor, um teólogo de pretensões apologéticas, um defensor da verdade única: o cristianismo como religião universal. Paulo foi, assim, capturado pela mitologia branca do ocidente capitalista - fono, falo, logo - cêntrica. Sabe-se, porém, que o nome pronunciado é um nome produzido. Não há presença, nem intenção, nem autor. Temos produções, que, como tais, podem ser construídas ou desconstruídas - conhecidas nas suas textualidades e investigadas nas forças do pensamento que são capazes de mobilizar. É o que esta obra nos possibilita: celebrar, junto com o Paulo-aos-Filipenses, o lucro da morte do Paulo-Presença, ou com um outro Paulo, o Paulo-aos-Coríntios, a produtividade daquilo que se faz outro, o devir daquilo que se faz outro de si mesmo: o judeu para com judeus, o não-judeu para com o não-judeu, o fraco, o tolo, o louco, o outro. O devir-Paulo. Acompanhemos, pois, o devir-Paulo na escritura, que é morte, testemunho e ressurreição - tudo ao mesmo tempo, agora, no evento-texto.
Fellipe dos Anjos
Quando alguém se propõe a interpretar o livro de Jonas, é difícil não se distrair com a passagem sobre o ¿ventre do peixe". A história de recepção deste livreto apresenta o relato de ¿Jonas no ventre da baleia¿ como o cerne de sua mensagem. Quantidade significativa de tinta foi usada no debate acerca de sua sobrevivência depois de passar três dias e três noites no interior do animal. Transformada em ortodoxia para alguns; suicídio intelectual, para outros, parece que esta narrativa é como areia movediça: pouco tempo nela e corre-se risco de atolamento! De forma geral, a mensagem de Jonas foi reduzida, mas nossas discussões buscam ampliá-la. Poucos comentam sobre a cabana confeccionada por Jonas, onde permaneceu alguns dias esperando pela destruição de Nínive. Da parte de Deus, a confrontação à Jonas não ocorreu na oração feita no ventre do peixe, senão quando dialogaram na cabana. Logo, o que propomos aqui não é "surfar na onda" passada da obra ficcional "A cabana", mas localizar o lugar de encontro entre nosso personagem e seu Deus; entre o desejo de vingança do profeta e a misericórdia divina; entre o sentimento xenofóbico judaico e o Deus que não faz acepção de pessoas. Não aspiramos conferir à cabana o que a tradição interpretativa fez com o ventre do peixe, mas enfatizar que o Deus que se revela a partir de elementos selvagens não tem lugar marcado e ideal para ir ao nosso encontro.